Vive-se hoje uma grande discussão envolvendo o conceito de em-presário e empreendedor. Já nos cansamos de ouvir falar em novos paradigmas nesses nossos tempos.
Estamos vivendo uma profunda mudança civilizatória. Mesmo falando e tentando estar atenta, todo dia descubro que esses novos tempos ainda estão só mostrando seus mais singelos sinais. Não temos idéia do que estaremos pensando ou escrevendo daqui a dez anos. Ainda engatinhamos na percepção do todo.
Continuamos a nos impressionar pelas partes. Não nos damos conta totalmente da revolução que a comunicação está exercendo e nem do seu poder. Estamos registrando vários fins: o fim do emprego como nós conhecemos, talvez também o fim do empresário clássico e do próprio conceito de lucro. Identifica-mos um crescente movimento de insensatos — aqueles que pensam que podem fazer as coisas de modo diferente e fazem. Esses insensatos de nosso tempo, em qualquer esfera, potencializaram-se por duas novidades da nossa era: conhecimento e tecnologia. Podemos ter resultados muito mais rápidos e globais para a nossa insensatez. Aí a figura daquele que empreende e ganha potencialidade. Os empreendedores dessa época estão por toda a parte, globalizados, fazendo suas próprias midias,inventando negócios, ganhando com novas atividades e formas. No meio da barbárie que construímos com eficiência no último século, havia mesmo que nascer empreendedores sociais. Eles estão construindo multinacionais que têm marcas que a sociedade civil reconhece, aplaude, interfere e até investe. Não está distante o tempo em que poderemos investir em bolsas de ações sociais. De doadores, poderemos passar a investidores.
É hora de refletir, não porque alguém disse ou escreveu, mas por-que o desatino da desumanização não está só escondido nas nossas prisões, mas está no futuro, que brinca de malabares bem ali na esquina por onde passamos. Hoje os meninos têm 9 ou 10 anos.E depois? Somos 54 milhões de excluídos. E daqui a 10 anos, quantos seremos? Alguns, viajantes mascarados para o futuro, descobriram formas de agir com profissionalismo, eficiência e eficácia. Gostaria de citar aqui dois exemplos que podem ser vistos, ouvidos e avaliados igualmente como fazemos com negócios empresariais. Em Betim, Minas Gerais, você pode conhecer, investir e apostar em um projeto que á mais conhecido no exterior do que no Brasil. Muitos mineiros fizeram da decoração de suas casas um gesto social. A empreendedora chama-se Noemi
Gonrijo e tem 80 anos. Nos olhos e na fala continua uma menina. Usou o prestígio de sua família e sua capacidade profissional para construir um empreendimento social. Dona Noemi anda pelo seu extenso e arrumado espaço de trabalho e todos olham para seus olhos com reverência. O espaço tem um circo para crianças, um trabalho para os adultos e educação para seus filhos, tem o tear dos adultos e o tear das crianças, oficina de boneca, marcenaria, berçário, almoço para mil pessoas.
Um trabalho de resgate da dignidade e da cidadania. Todos trabalham e constroem o Salão do Encontro. No meio de famílias carentes, adultos portadores de deficiência. Todos encontram na solidariedade um forte motivo para viver. Dona Noemi me mostra uma peça linda de barro e conta que já ofereceram muito dinheiro por ela. Não foi vendida, está ali para lembrá-la que aquele
menino artista não conseguiu salvar-se. Quando ela me contou isso, vi nos seus olhos uma energia que nunca esquecerei, a energia de quem faz sem vaidade, sabendo dos seus limites. Não há um vídeo sobre seu trabalho, ela não sai à caça de prêmios, apenas tentou “fazer” nos últimos trinta anos, e por isso... fez. Hoje ela espera ter a solução para que tudo siga quando ela não estiver. Ali tem uma metodologia, uma pedagogia para ser reaplicada se formos rápidos em aprender.
Vou para outra cidade, Campinas. Descubro favelas, invasões, re-descubro Campinas. Lá, várias mulheres de uma associação de mora-dores falam de um projeto da Tia Ileide. Saio à procura e depois de passar por uma área de invasão recente onde as casas ainda são de papelão, de caixote, encontro um oásis, uma ótima construção, limpa, organizada, um mural cheio de fotos e um coral cantando ao longe. Sigo e a Dona Dilma me explica o projeto, que já tem 10 anos. Nasceu da atenção de Silvia, que tinha uma empregada que morava ali. De origem alemã, ela ficava perplexa com a situação de sua empregada. Foi visitar sua “casa”. Ali implantou o projeto Tia Ileide que é o nome de quem auxiliava sua família no Brasil. Peço para ver o coral. E me encanta ver as mudanças que se operam com nossas crianças quando encontram uma oportunidade. Em seguida encontro um senhor distinto, muito bem vestido e com sotaque alemão. Escuto suas avaliações sobre o projeto, a cidade de Campinas e não resisto: pergunto o que fazia antes de estar alí aplicando com paixão seus investimentos de tempo e conhecimento. Era o Presidente da Bosh.
Não há brincadeira ou assistencialismo para essa turma: há empreendedorismo social. Esses são apenas dois exemplos do que venho colecionando e registrando por esse Brasil.
Nas minhas noites tranqüilas, escrevendo artigos e planejamen-tos, pergunto-me: onde está o governo? Talvez ele não tenha de in-ventar a roda, talvez tenha só de unir-se àqueles que fazem e sabem fazer. Poderíamos negociar 10% da dívida externa para aplicar nas mãos de gente que faz. Quanto isso representaria para avanços sociais? A máquina dos govermos ... bem, vamos deixar para lá e torcer pelas QNG’s internacionais, que também são marcas globais inaugurando um novo tempo, pelas novas empresas que estão colocando responsabilidade social nos seus planos estratégicos e por nossa capacidade de mudar e influenciar.
Quem quiser mais dados sobre os projetos contatar po e-mail
reboucas@reboucaseassociados.com.br.
Nádia Rebouças
Diretora Geral da Rebouças&Associados
quinta-feira, julho 08, 2004
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