quarta-feira, outubro 06, 2004

A REINVENÇÃO DA EMPRESA NO SÉCULO XXI



Em busca do sentido perdido

Paulo Monteiro de Carvalho

"Eu conheço um planeta onde há um sujeito vermelho, quase roxo. Nunca cheirou uma flor. Nunca olhou uma estrela. Nunca amou ninguém. Nunca fez outra coisa senão somas. E o dia todo repete como tu "Eu sou um homem sério! Eu sou um homem sério!", e isso o faz inchar-se de orgulho. Mas ele não é um homem, é um cogumelo."
Esse não é simplesmente um parágrafo de uma das obras literárias mais importantes da historia - O Pequeno Príncipe - mas uma profecia que se confirma e se materializa cada vez mais na atualidade. Esse planeta poderia muito bem chamar-se Terra, e esse sujeito quase roxo, José, João, Márcia, Roberta, cada um dos milhões de seres que dedicamos tanto tempo a somar, a inchar-nos de orgulho fazendo "coisas sérias", esquecendo de olhar uma estrela, de amar alguém...
Nos dias atuais enfrentamos uma trágica realidade: a falta de sentido nas coisas que fazemos, a prisão de ter que repetir ações mecânicas, sem usufruir o prazer de transcender em cada uma delas. Essa falta de sentido é também herança de uma mentalidade positivista, que baniu da existência humana qualquer sentido metafísico, espiritual, universal, para concentrar-se somente nos números, no empírico, na experiência "científica", numa aventura que levaria o homem a "conquistar" seu universo.
Com o inicio da revolução industrial e a concentração na produção, a lógica predominante passa a ser a visão racional-econômica, que concebia a organização como um mero ente produtivo cuja missão essencial era obter os melhores resultados com os menores custos. Tal enfoque faz tudo girar em torno dos resultados, e o ser humano passa a ser visto como parte de uma engrenagem que deve gerar sempre a melhor produção possível; ele existe e tem sentido somente na medida em que é um instrumento para melhorar o rendimento da empresa.
Em pleno século XXI esse cenário ainda resiste a desaparecer de nossa história. Muitas empresas insistem em centralizar-se nos resultados, submetendo as pessoas a essa obsessão que termina por transformar-se em um fim absoluto. Mas o paradoxal dessa mentalidade é que o campo "sagrado" dos resultados - objetivo de toda empresa - termina sendo prejudicado precisamente por essa atitude que submete as pessoas às metas de produção e de lucro.
Isso ocorre porque a mentalidade economicista na empresa aliena o homem, fazendo-o escravo de uma produção que não possui; os "sagrados" resultados pertencem aos "donos", aos "proprietários" da organização. Assim, o ser humano - que é por natureza um ser transcendental - perde toda e qualquer motivação ao não encontrar sentido no que faz, e seu agir profissional passa a ser necessidade de sobrevivência, conduta que termina por limitar os resultados de seu desempenho a níveis mínimos.

O renascer do humanismo nas empresas
Felizmente, em meio a essa visão pragmática e utilitarista que ainda prevalece, do que deve ser a empresa, observamos um fenômeno de humanização cada vez maior no âmbito corporativo. São cada vez mais os autores que se dedicam ao tema da pessoa como fator central e vital para o desenvolvimento da empresa.
Vemos também o surgimento da Responsabilidade Social Empresarial como uma forma global de conceber e gerir a organização. A empresa, nesse contexto, passa a ser muito mais que um mero ente produtor, convertendo-se em entidade co-responsável pela construção de uma sociedade melhor, missão que abrange clientes, meio ambiente, colaboradores e funcionários, acionistas, enfim, todas as realidades e ambientes que interagem com a organização.
Nessa visão, o âmbito dos resultados deixa de ser um fim em si mesmo, para tornar-se fruto de uma motivação que se materializa no trabalho. É precisamente este sentido recuperado no ambiente profissional que, levando ao compromisso e à atitude, tem como conseqüência natural a conquista dos melhores resultados.

A empresa como um totus significativo
A organização que se atreve a ser autenticamente humana funciona, em palavras de Peter Senge, como uma comunidade consciente, um organismo vivo onde tudo comunica, tudo é parte de um projeto comum e de uma missão global. Se a mentalidade cartesiana e racionalista vê a comunicação empresarial como produção de uma coleção de mídias, a concepção humanista define a organização como uma entidade viva e dinâmica que se comunica constantemente, em cada uma de suas ações e realidades, desde a arquitetura dos edifícios e salas até as ações e conversas dos funcionários.
Esse universo comunicacional forma o que alguns autores chamam de ecossistema comunicativo, um cosmos organizacional, no qual as diversas partes interagem num processo sinérgico e construtivo que tem uma orientação comum e se desenvolve como um sistema de relações ricas e significativas.
O universo desse totus significativo dá lugar a uma comunicação que é muito mais que a mera transmissão unilateral ou vertical de dados e informações. A palavra "comunicar" vem do latim "communicare" que tem um sentido de "movimentar juntos" e tem a mesma raiz da palavra latina "communio", que significa comunhão. A autêntica comunicação deve estar, portanto, necessariamente comprometida com o ser humano e com seu enriquecimento, promovendo um âmbito comunitário significativo.
Posted by Hello

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